FINLÂNDIA, PAÍS MAIS FELIZ DO MUNDO: EMBAIXADORA ENSINA 'RECEITA' AOS BRASILEIROS

  Johanna Karanko

Finlândia, país mais feliz do mundo: embaixadora ensina a ‘receita’ aos brasileiros

Johanna Karanko diz que seu povo tem motivos para sorrir: serviços de educação e saúde são excelentes, o ar é o mais puro do planeta e as instituições são as menos corruptas

Por Eliane Oliveira — Brasília

28/04/2023 15h31  Atualizado há 11 meses

Nos últimos dias, a Finlândia ganhou destaque no noticiário internacional e não apenas por ser o mais novo membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Pelo sexto ano consecutivo, o povo do país foi eleito como o mais feliz do mundo, de acordo com um ranking da Organização das Nações Unidas, enquanto o Brasil perdeu posições e ficou em 49º lugar.


Em entrevista ao GLOBO, a embaixadora da Finlândia em Brasília, Johanna Karanko, afirma que o povo de seu país tem vários motivos para sorrir: os serviços de educação e saúde são excelentes, o ar é o mais puro do planeta, não há assaltos, e as instituições são as menos corruptas do mundo. Ela destaca que os finlandeses querem compartilhar essa felicidade, inclusive com os brasileiros. Leia abaixo a entrevista na íntegra:


Por que o povo finlandês é o mais feliz do mundo?

Ser feliz não significa ser sorridente ou alegre. Há questões mais estruturais, e uma delas é a confiança de que as coisas funcionam, as autoridades, as instituições. Outra questão é a segurança, ou seja, a sociedade se sente segura. E há também a certeza quanto às oportunidades. No primeiro ano, ficamos um pouco surpreendidos, imaginando se era verdade que éramos os mais felizes do mundo. Mas, depois de pensar muito sobre isso, achamos que sim.

Além da crença nas instituições, como é a qualidade de vida na Finlândia?

Temos muitos bosques e lagos: 75% do país são bosques. Temos o ar mais puro do mundo. E pensamos que a natureza também traz felicidade, porque depois de um dia de trabalho você pode andar em um bosque, com segurança, sem perigo de ser assaltado. Há pesquisas que dizem que somos o país mais seguro do mundo.

Quanto às oportunidades iguais, isso vale para estrangeiros que queiram viver na Finlândia?

Exatamente. Todo mundo pode ser o que quiser, com as mesmas oportunidades. No Legislativo, por exemplo, temos muitas mulheres parlamentares. No Parlamento de 1907, tivemos oito mulheres entre as 200 cadeiras. E, depois, a igualdade foi crescendo, como você já sabe. Mulheres e homens podem fazer qualquer coisa. Um dado importante: o voto na Finlândia não é obrigatório, mas na última eleição a participação foi de 44%. Gostamos da democracia.

Casos de corrupção existem?

Somos o país menos corrupto do mundo, segundo a Transparência Internacional. Por isso, há confiança no governo, o que é uma qualidade da democracia.

Qual o PIB per capita?

Cerca de US$ 50 mil. Há 100 anos, a Finlândia era um país pobre, e não tínhamos muitos recursos naturais. Porém, investimos muito em educação e oportunidades iguais para todos, porque achamos que temos de cobrar dos candidatos que foram eleitos. Há, também, a saúde e a expectativa de vida, que têm aumentado o tempo todo. A expectativa de vida para mulheres é 84 anos e para os homens aumentou para 80 anos.

Como são os sistemas de saúde e educação?

Temos sistemas de saúde e educação públicos. Mas o Estado paga para o aluno que frequente uma escola privada, se ela está mais próxima de sua casa. Por isso, estamos entre os dez melhores em educação. Os níveis das escolas são os mesmos em todos os lugares. E isso acontece porque valorizamos muito a educação. Todos os professores de educação básica têm mestrado, no mínimo. E também têm muita independência. O professor pode decidir o que vai fazer em sala de aula, e não o diretor da escola. Há um planejamento de governo, mas o professor pode decidir como implementá-lo.

Qual a taxa de desemprego?

Atualmente, a taxa está em torno de 6% a 7%. Temos desemprego e temos também falta de mão de obra. Precisamos de 50 mil pessoas por ano para trabalhar. Nós temos desemprego, mas é um desemprego estrutural. A Finlândia é um país pequeno se comparado com o Brasil, mas, em comparação com países europeus, é bastante grande. São 358 mil quilômetros quadrados, o que equivale à metade da França, ou à metade do estado de São Paulo. Temos pessoas vivendo em todo o país, mas podemos dizer que muitas pessoas trabalham em lugares diferentes de onde moram. Além disso, esse desemprego estrutural decorre da falta de qualificação adequada para determinados empregos.

Tem salário mínimo em seu país?

Não. Mas temos sindicatos muito fortes, que negociam acordos com o Estado, que normalmente duram alguns anos. Esses acordos passam, além de condições de trabalho, por aumentos salariais. Os salários dependem do tipo de emprego.

Qual o forte da economia na Finlândia?

No início, éramos bosques e homens. Assim, uma das indústrias básicas que se desenvolveram, com a qual temos uma forte parceria com o Brasil, é a de papel e celulose. Por exemplo, no Brasil há fábricas do setor em construção e os equipamentos para essas fábricas vêm da Finlândia. Também fazemos parceria com o Brasil em bioeconomia. Na Finlândia, uma árvore demora 70 anos para crescer, enquanto no Brasil os eucaliptos crescem em sete anos. Em termos de rentabilidade, é muito melhor produzir a celulose aqui. E nós produzimos a maquinária. Temos, ainda, a alta tecnologia. Somos o país que mais investe em pesquisa no mundo. Em telecomunicações, estamos entre os primeiros do mundo. Fala-se em 5G, mas já estamos desenvolvendo 6G em parceria com o Brasil. E, por fim, somos líderes em games.

Vocês abriram inscrições para brasileiros que querem participar de ‘aulas de felicidade”, com passagens e hospedagem grátis. Tem muita gente se inscrevendo?

As inscrições ainda estão abertas. No ano passado, tivemos um programa para empresários e investidores. A pessoa é colocada numa casa finlandesa e vai entender como é a vida ali. Em geral, estamos abertos para os estrangeiros para turismo, trabalho ou apenas experiência.

Há intercâmbio para estudantes do Brasil, por exemplo?

Queremos aumentar o intercâmbio entre a Finlândia e o Brasil, trazendo benefício para os dois países. Desde outubro do ano passado, contamos em nosso consulado com uma pessoa especializada em aumentar relações entre universidades e centros de pesquisa entre os dois países, justamente para termos mais brasileiros estudando na Finlândia e mais finlandeses estudando no Brasil. Temos vagas de emprego em vários setores, como restauração, turismo e games. Nossa felicidade não é um segredo e estamos querendo compartilhá-la.

Para trabalhar no seu país é preciso aprender finlandês?

O inglês é uma língua que todos falam. Temos 500 programas universitários em inglês, assim como postos de trabalho. Porém, se você for trabalhar em hospital, é preciso falar finlandês. E temos uma segunda língua oficial, que é o sueco. Somos oficialmente bilingues.

De forma geral, a visão que o cidadão brasileiro comum tem da Finlândia é de que é um país frio, sempre com neve.

Não é correto. Temos verão, calor de 35 graus, tudo fica muito bonito. Nadamos em 133 mil lagos. E também temos mar. Por outro lado, o inverno é uma época muito especial para nós. Valorizamos o nosso inverno, que é de janeiro a março. O país fica completamente coberto por neve, a natureza fica completamente branca, nós aproveitamos para passar um tempo fora de casa, nós podemos andar nos lagos congelados, praticar esportes de inverno. E temos aquecimento dentro de casa e dos carros. Você só sente frio se quiser. O finlandês parece frio, mas quando você o conhece, ele é muito acolhedor. Se o finlandês o convidar para sua casa, ele quer realmente que você vá, pode acreditar.


Fonte:https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2023/04/finlandia-pais-mais-feliz-do-mundo-embaixadora-ensina-a-receita-aos-brasileiros.ghtml

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